Certa vez fomos indicados, para atuar como defensor público, na defesa de uma pessoa que estava sendo acusada da prática de uma série de crimes de homicídio - art. 121, do Código Penal brasileiro - e outros crimes conexos, todo eles, cometidos, segundo a denúncia do órgão acusador – Ministério Público paulista – com alto requinte de violência e crueldade.
Examinado, cuidadosamente, o caso, constata pela prova encartada nos autos, que essa pessoa respondia a outros processos naquela mesma Vara – criminal – do Júri. Consultando um desses outros processos descobrimos, que o acusado tinha se submetido a exame de insanidade mental, cuja perícia – parecer médico - o qualificava como pessoa absolutamente incapaz para responder criminalmente por seus atos. O louco, como se sabe não pode ser considerado um delinqüente.
Constatada a anomalia - enfermidade – psíquica do acusado e estando ele Pronunciado, - a pronúncia é uma fase judicial que antecede o julgamento nos tribunais do Júri - aguardando designação de data para ser julgado pelo Tribunal do Júri, pouco ou quase nada, nos restaria a fazer naquele momento, senão esperar por esse julgamento popular que não demorou a ser designado.
Na data designada para esse julgamento, apregoada as partes, apresentado o réu, aberta enfim a Sessão, com as solenidades de costume, em conversa reservada com o doutor Promotor de Justiça, ponderamos - lhe, de que aquela pessoa que ali se encontrava, diante dos nossos olhos, era absolutamente incapaz para responder por atos criminosos.
Convencidas às parte, defesa e acusação, do estado de irresponsabilidade – art. 26, do Código Penal - penal do acusado, postulamos, com apoio na prova dos autos, perante o Júri, fosse o mesmo declarado pessoa incapaz – inimputável - para responder pelos atos criminosos a ele imputado.
O Júri, reunido naquela Sessão Plenária, realmente entendeu, por votação unânime (7 x 0) que o acusado era pessoa portadora de doença mental e por isso, ao invés de ir para a cadeia deveria se submeter a tratamento psiquiátrico.
Uma vez reconhecida a irresponsabilidade penal foi aplicada ao acusado a sanção penal de MEDIDA DE SEGURANÇA detentiva para tratamento médico em Hospital Psiquiátrico do sistema penitenciário.
Fato curioso e digno de nota aconteceu no curso desse julgamento.
Ao ser interrogado, pelo juízo de Direito Presidente daquela Sessão Plenária, a juíza, após a leitura da denúncia, perguntou-lhe:
- O senhor sabe porque esta sendo processado?
- Não. Não sei não senhora.
- O senhor tem alguma coisa a ver com esses fatos, com esses crimes descritos na denúncia?
- Não meritíssima. Nessa época nem em São Paulo
eu estava.
- Onde o senhor estava então? indagou a juíza.
- Naquela ocasião eu estava em Taubaté.
- Naquela época eu era Repórter Policial da Rádio Cacique de Taubaté.
Ao ouvir essa fantasiosa versão e sabendo nós, que o acusado estava internado em Hospital Psiquiátrico, anexo a um presídio de segurança máxima daquela cidade do vale do Paraíba, para tratamento médico-psiquiátrico, nos convencemos, mais uma vez, de que aquele indivíduo era realmente um louco, um desequilibrado mental e olhando discretamente para o doutor Promotor de Justiça, que atuava no caso, fizemos um gesto com a cabeça, reafirmando. É doutor... o homem é mesmo um louco, um doido varrido.
Geraldo Martinho - Coisas do Direito